terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Quase uma carta.

Não interajo com a noite de hoje, a porra da noite de hoje faz um calor infernal e eu sinto como se minha cabeça estivesse abarrotada de chineses e seus pasteis engordurados. Não sobrou nada da alegria de ontem, nem da cachaça diluída no sangue, nem do conhaque e das cinco ou seis cervejas. Não sobrou nada dos meus amigos nessa solidão de se esgueirar pela janela, pra ver se alguém morre atropelado, para ver se algum bêbado passa e me revela o segredo para tomar o remo das mãos de Hades quando eu chegar por lá. Ficou a secura, a saudade do cheiro do seu pescoço enquanto todos os garçons do bar se perguntavam como um cara tão feio conseguiu uma garota tão bonita quanto você, alias eu me perguntava isso e ainda pergunto. É fevereiro e ponto final dizem os jornais, sarcásticos jornais vendidos em branco, só a data pra esfregar na minha cara que eu to ficando mais velho, mais acabado e mais feio. Só a maldita data me lembrando que eu vou ter que agüentar mais um bom tempo até te ver. Tem um whisky embaixo da minha cama, mas eu não vou tomar. Se eu tomar vou pegar esse celular e encher teu saco, vou ligar pros meus amigos e alguns deles estarão bêbados como eu e outros esperando resultados de prova. Eis a formula principal, o axioma, a lei do (de todo)momento é continuar. É ajeitar os óculos e despentear os cabelos, é ser chamado de viado por não dar atenção para qualquer coisa que respire e esfregue o peito pelo balcão do bar aos gracejos, é ouvir musica antiga e de fossa que sequer rende um papo inteligente. É continuar embora doa (e doi),embora desconheça-se o rumo, continuar embora todos estejam por ai dormindo pra construir um futuro, futuro? Se minha família quisesse de mim um futuro não deveriam ter me dado livros quando pedi e sim me empurrado para o futebol, todos que jogavam futebol naquela época parecem ter acabado bem. Se Deus me quisesse sóbrio não teria me feito essa caricatura, não teria me feito inteligente para tudo o que não é útil. São duas e cinqüenta e um e eu só queria escrever esse texto para te responder que no fim talvez você tenha razão. A palavra amor é só uma desculpa para os humanos se sentirem maiores e menos vermes. O amor é para os fracos você talvez pensasse, e talvez todos os clichês façam sentido quando abro minha boca abarrotada de coisas antiquadas para um alguém tão cheio de fogo e vida, é talvez sim. Talvez amar seja sorvete na calçada, seja praia no reveillon e carne vermelha todo dia numa panela já meio descascada de gordura. Mas eu nunca vi um amor que se sustentasse em palavras, que crescesse a medida que se desencontra, que não houvesse a necessidade de cobranças, que incendiasse noites insones e intimidasse carteiros. Um domingo qualquer vamos passear de mãos dadas e vai ser cafona, mas vai ser lindo também. E a noite depois que fizéssemos amor eu pensaria sobre os homens e os tais vermes de que você falava, e então sua pergunta não teria mais relevância ao ouvir tua voz de sono me chamando de volta. Tudo bem, vai ver que você estava certa. Então também vai ver não é amor isso que eu te me provoca a boca quando tudo mais é sombra e seca as mãos embora chova, mas é grande, é imenso, e não tem nome, não precisa, e ainda assim é tudo o que importa se ter entre as mãos nesses tempos de guerra.